domingo, 2 de novembro de 2008

A IMPOPRTÂNCIA DA FILOSOFIA NA FORMAÇÃO DO EDUCADOR

A IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA NA FORMAÇÃO DO EDUCADOR
(Dildo Brasil)

Com a volta da filosofia ao ensino médio é interessante refletir e discutir sobre a formação filosófica dos professores. Porém é importante lembrar que essa discussão não é nova e a reflexão sobre esse assunto já existe há muito tempo. Entre as tantas reflexões realizadas desde a década de oitenta, encontrei uma que considero importante ser retomada.
Esta reflexão se encontra no livro de Antonio Joaquim Severino, publicado pela Editora EPU, em 1986, cujo título é “Educação, Ideologia e Contra-Ideologia”. Os trechos que vou reproduzir abaixo encontram-se nas páginas XIV e XV da Introdução do livro.
O autor começa dizendo que a existência de uma disciplina como a Filosofia da Educação “no currículo dos cursos de preparação de professores justifica-se não por alguma sofisticada erudição ou academicismo: é uma exigência do próprio amadurecimento humano do educador.” Afirmação da qual não podemos discordar, uma vez que a educação não pode ser considerada um processo neutro, isento de caráter político e ideológico. Assim como não conseguimos discordar quando ele afirma que:
“Coloca-se, com efeito, uma questão antropológica: trata-se de explicitar qual o sentido possível da existência do homem brasileiro como pessoa situada na sua comunidade, de tais contornos sociais e em tal momento histórico.”
“Esta reflexão filosófica – diz Severino - desenvolvida no âmbito teórico da filosofia da educação, deverá dar ao futuro educador a oportunidade da tentativa de explicitação do projeto existencial a se buscar para a comunidade brasileira, na busca de seu destino e de sua civilização. Ou seja, não é possível compreender um projeto educacional fora de um projeto político, nem este fora de um projeto antropológico, isto é, de uma visão de totalidade que articula o destino das pessoas com o destino da comunidade humana.” (grifo meu).
Parece-me que apenas os trechos anotados acima já seriam suficientes para uma longa e demorada reflexão em torno do ensino da filosofia, tanto no Ensino Médio quanto nos cursos de Formação de Professores. Particularmente, já vivenciei a experiência de levar pra sala de aula o trecho que grifei no parágrafo anterior e passar quase quatro horas-aulas refletindo sobre ele, sem esgotar o assunto. Pois, as alunas de Pedagogia, com quem fiz a experiência, mostraram-se sedentas de conhecimentos básicos oferecidos pela área (ou disciplinas) de humanidades.
Por isso é que eu não consigo compreender as razões pelas quais as Instituições de Ensino Superior (IES) privadas diminuem, cada vez mais, a carga horária das disciplinas básicas ou de humanidades e aumentam as famosas disciplinas de práticas, didáticas e metodologias. Será que é por motivações político-ideológicas? Eis uma pergunta que tenho medo de fazer e chegar a uma resposta positiva. Então, antes que eu comece a fazer outras perguntas perigosas, vou me limitar a anotar mais alguns trechos do texto do Professor Severino para que o leitor ou leitora faça suas próprias reflexões.
Minha sugestão é que se reflita separadamente os dois textos que vou anotar. Porém, nada impede que se reflita sobre os dois ao mesmo tempo. Na verdade, são dois parágrafos que aparecem na seqüência no livro de Severino.

Texto 1
“Assim, cabe à reflexão filosófica explorar o significado da condição humana no mundo. E à filosofia da educação explicitar esse significado para o educador. Vale dizer, pois, que a filosofia da educação deve colocar para o educador a questão antropológica, questão que deve equacionar adequadamente, recorrendo à filosofia social e à filosofia da história, e fundamentando-se numa antropologia, alicerce último de toda reflexão sobre o realizar-se do homem. Obviamente, a explicitação do significado da própria atividade filosófica é tarefa preliminar: o alcance do pensamento humano, o seu equacionamento epistemológico é questão permanente para a filosofia.”

Texto 2
“O educador não pode realizar sua tarefa e dar a sua contribuição histórica se o seu projeto de trabalho não estiver lastreado nesta visão da totalidade humana. À filosofia da educação cabe então colaborar para que esta visão seja construída durante o processo de sua formação. O desafio radical que se impõe aos educadores é de um ingente esforço para a articulação de um projeto histórico-civilizatório para a sociedade brasileira como um todo, mas isto pressupõe que se discutam, com rigor e profundidade, questões fundamentais concernentes à condição humana.”
Por fim, parece-me que o pequeno trecho com o qual encerro minhas anotações, trás uma afirmação que nos proporciona vasto e rico material para as nossas reflexões sobre a formação daqueles e daquelas que irão educar as novas gerações nas escolas, públicas e privadas, em todo o Brasil.
“Assim, é tríplice o objetivo da educação do educador: ela deve lhe dar formação científica, formação política e formação filosófica (grifo do autor). À filosofia da educação, enquanto área de reflexão, cabe a tarefa pedagógica de responder pela formação filosófica.”

Dildo Brasil
07 de setembro de 2008.

METODO E MATERIAL DA FILOSOFIA COM CRIANÇAS

MATERIAL E MÉTODO DA FILOSOFIA COM CRIANÇAS
(Dildo Brasil)

1. Ao discutirmos o método e material produzido por Lipman e traduzido pelo CBFC chegamos facilmente à conclusão de que é um material que não possibilita filosofar com as crianças e que o método de Lipman/CBFC tem inúmeras outras deficiências já apontadas por Renê Trentin, em sua tese de doutoramente pela Unicamp.
No entanto essa reflexão nos leva perguntar-nos: é justo dizer que o material e o método oferecidos por Lipman é porcaria? Que é completamente ineficiente e sem utilidade? Ou que não ajuda a pensar filosoficamente?
Quando alguém afirma que trabalha com as novelas de Lipman, mas o faz de modo subversivo (subverte-as). Isso é digno de credito? É realidade ou ilusão, uma espécie de auto-engano?
Até que ponto é possível fazer a subversão das novelas de Lipman, publicadas e comercializadas pelo CBFC? Até que ponto pode-se dar crédito a afirmação ou promessa de que se faz essa subversão? Até que ponto tal subversão, supondo-a verdadeira, muda as possibilidades de se ensinar filosofia com as novelas de Lipman?
2. As reflexões realizadas até o momento nos levam a crer que as novelas de Lipman funcionam como qualquer livro didático (não que sejam livros didáticos ou se pareçam com um livro didático, isso não). Estamos dizendo que as novelas de Lipman funcionam ou podem funcionar como os livros didáticos. Daí sermos instados a perguntar: como pensamos, concebemos e concretizamos, em sala de aula, a nossa relação com o livro didático? Qual a nossa concepção de livro didático?
Somos daqueles que seguimos à risca o livro didático e suas instruções, sem delas fugir milímetros sequer?
Ou somos do time que usa o livro didático apenas como roteiro e sugestão de temas e seqüencia temática, isto é, um roteiro temático que pode ou não ser seguido? Em usando o livro didático, conseguimos extrair dele um conjunto de ações e sugestões metodológicas que vão além, muito além da letra do texto e das linhas ali propostas?
Nesse sentido é que podemos perguntar se as novelas de Lipman possibilitam uma adaptação criativa. Ou seriam grilhões intransponíveis que impossibilitam o pensar criativo e filosófico, tanto para as crianças quanto para os adultos, especialmente professores e professoras?
3. Quem sabe filosofia pode praticar o filosofar, a partir de qualquer material. Pode, portanto, praticar a reflexão filosófica a partir das novelas de Lipman. Mas essa pode se tornar uma afirmação perigosa, bem o sabemos. Pois, se mal entendida, pode descredenciar a necessária busca por materiais melhores e mais adequados ao ensino da filosofia. Além disso, pode parecer que estamos sugerindo uma posição oligarca aos formados em filosofia. O que estaria em aberta contradição com a tradição filosófica que afirma ser a filosofia uma prática natural do ser humano (Gransci). No entanto, o que estamos supondo é que essa afirmação pode e deve nos incentivar a outras questões, como as que apresentamos a seguir.
4. As deficiências que podemos apontar no material e no método de Lipman são deficiências e falhas reais ou criadas pela nossa imaginação? Ou, indo um pouco mais longe e a fundo: são deficiências que residem no material e no método propostos por Limpam ou são carências e fraquezas que residem no professor(a) que com eles se propõem a trabalhar? É o material e o método que não funcionam ou será o professor que, por incompetência técnico-pedagógica não sabe fazê-lo funcionar?
Se bem que podemos concordar com Renê Trentin e admitir que a finalidade última da proposta de Lipman não é o filosofar como crítica do mundo e das relações do homem com o mundo, consigo mesmo e com seu semelhante. Mas é, antes, uma proposta de adaptação do homem às estruturas sociais, políticas e econômicas vigentes no mundo urbano-industrial e capitalista. E Lipman não esconde isso.
E, em hipótese alguma, é essa a nossa concepção da filosofia e do quefazer filosófico.
Por isso é que devemos continuar perguntando, refletindo, investigando e perscrutando o nosso objeto de reflexão, isto é, o material e o método sugeridos por Lipman e pelo CBFC. E, então, nesse processo de investigação, surge a questão: qual outro material, existente hoje no Brasil, é melhor que o disponibilizado pelo CBFC? Ou, em outras palavras, qual outro material existe hoje que oferece reais condições de um filosofar verdadeiro e efetivo? Temos opção que não a oferecida por Lipman e CBFC? O mesmo deve-se dizer, perguntar, do método.
5. Nós do NEFIC sabemos que o Dr. Marcos Sidnei Eusébio-Pagoto, atualmente professor da UMESP, em São Bernardo do Campo, produziu um material para trabalhar filosofia com crianças. Sabemos que ele próprio e outras pessoas usaram esse material em escolas da região do ABC Paulista. Porém, depois esse material foi abandonado até pelo próprio autor. Por que será que o abandonaram? Será que foi por ineficiência do material? Ou ineficientes foram os que deles fizeram uso, incluindo aí o seu próprio autor? Talvez, porque as exigências da realidade das salas de aula não combinavam com a proposta do material. Material e realidade não entraram em sintonia.
Qual material possibilita filosofar com as crianças? Eis uma pergunta que não se deixa calar.
6. Por isso devemos continuar nossas investigações. O próximo passo é perguntar: compreendemos efetivamente a proposta apresentada por Lipman de promover nas crianças o pensar de “ordem superior”? É essa uma proposta possível de ser efetivada, concretizada? Vejam que, caso decidamos que a proposta de Lipman/CBFC é possível de ser efetivada, resta ainda perguntar se o ambiente das nossas escolas permite tal concretização. É necessário e oportuno perguntar até que ponto o ambiente escolar que temos nos dias atuais possibilita ou permite filosofar com as crianças.
7. Temos notícias de um grupo de Florianópolis, Santa Catarina, o Grupo S.E.R. (Sistema de Ensino Reflexivo) que oferece assessoria, ministra cursos e treinamentos e publica vasto material para se trabalhar filosofia com crianças. Será este material bom, eficiente e adequado para o ensino da filosofia para crianças? Ou seria, também este, deficiente e carente de valor filosófico, pedagógico e didático? O que falta a este material disponibilizado pelo grupo SER? Seria o mesmo que falta às novelas do Lipman e ao material produzido pelo Dr. Marcos? Mas o que é que realmente falta a todos eles?
Há, também, um grupo em Curitiba, Paraná, dirigido pelo Dr. Darcísio Muraro e sediado na Fundação Sidônio Muralha. Qual a proposta deste grupo? O que ele propõe e/ou oferece para a prática da filosofia com crianças? Até onde sabemos o grupo da Fundação Sidônio Muralha, não tem material publicado, mas oferece cursos, treinamentos e assessoria para as escolas que desejam trabalhar filosofia na educação infantil e ensino fundamental.
Devemos admitir que falta-nos material, dados e informações para avaliar as propostas e materiais oferecidos pelo grupo de Curitiba, pelo grupo de Florianópolis e pelo Dr. Marcos, do ABC Paulista. Resta-nos, portanto, as críticas que temos ao material e à proposta de Lipman. No entanto, é necessário perguntar: as nossas críticas ao método e ao material propostos por Lipman/CBFC abrem possibilidades ou caminhos para a produção de outros materiais e métodos melhores?
É possível comparar e escolher entre os materiais e métodos oferecidos pelos diversos grupos nomeados acima?
Quanto ao método, cada grupo sugere método diferente ou muda o material e permanece o mesmo método? Qual dos grupos nomeados acima tem proposta metodológica realmente diferente da oferecida por Lipman/CBFC?
8. Ou, quem sabe, tenhamos que pensar numa absurda possibilidade assim formulada:
► Todos esses materiais e metodologias são filosoficamente incompletos e pedagogicamente carentes de sintonia com a criança e com o pensar filosófico. Têm, todos eles, aspectos positivos (bons e eficientes) e aspectos negativos (ruins e deficientes). No entanto, são tão somente sugestões bem intencionadas. Nascidas de louváveis e esmerados esforços. O que faz de todos eles apenas passo primeiro ou convite ao filosofar, como diria Marilena Chauí.
► Sendo assim, não seria tarefa nossa, daqueles e daquelas que desejam e se dispõem a fazer filosofia com crianças, criar formas, métodos e condições criativas de utilizar qualquer um deles que se nos chegue às mãos, uma vez que filosofia é, reconhecidamente, ciência e arte ao mesmo tempo?
► Para tanto, o que nos aprece necessário e também bastante óbvio, é ter criatividade e ousadia. É necessário criar e arriscar metodologias que efetivamente ajudem a criança a pensar lógica e criativamente. Fazer a criança pensar, bem no estilo socrático, sem medo da censura dos adultos. Obviamente, dentro dos seus limites e possibilidades.
Isso, no entanto, dá muito trabalho.


Dildo Brasil
10/10/2008 (às