terça-feira, 12 de agosto de 2008

O que fazer?

As duas postagens anteriores feitas no Blog do NEFiC pelo Lupércio Rizzo e pelo Dildo Brasil – respectivamente com os títulos “O papel da didática no ensino superior” e “O Brasil precisa de professores de Filosofia” (esta última reproduzindo matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo) – motivaram algumas reflexões que tentarei sintetizar a seguir. Acho que o assunto dá “pano pra manga”, e portanto não será absolutamente esgotado aqui: espero, antes, que estimule outras reflexões.
Coloco-me no papel de educador. Penso nas perguntas fundamentais que norteiam o meu trabalho prático. Mesmo falando em “perguntas fundamentais” não chamo aqui os problemas ontológicos consagrados pela filosofia (quem sou eu?, o que é o ser humano?, é possível ensinar algo a alguém?, etc.). Minha questão é menos elaborada e, quem sabe (trata-se de uma provocação), mais útil: devo perguntar “como ensinar” ou “o que ensinar”? Ou, para ficar em termos mais próximos aos consagrados por revolucionários como Lênin ou educadores inspirados nos revolucionários, como Paulo Freire: “o que fazer” ou “como fazer”?
A pergunta pelo “como fazer” (as “receitas” criticadas pelo Lupércio na postagem abaixo) parece ser uma questão puramente metodológica. Como faço pra chamar a atenção dos meus alunos? Como poderia eu “dominar” (seria expressão de um sádico desejo de dominação?) meus alunos, fazendo-os agir como entendo adequado? Numa única questão: como faço para ensinar de forma eficiente?
É certo que estas perguntas não são inválidas. O processo de educação pressupõe a comunicação, de modo que é relevante saber como posso me comunicar de forma mais eficiente. Mas caso eu saiba “como ensinar”, caso eu consiga eficiência comunicativa, precisarei de eficiência educativa. Terei que perguntar “o que ensinar”.
Mais que isso: se eu não souber ao certo “o que ensinar”, porque me preocuparei em estabelecer um “como ensinar”?
Posso ensinar a um jogador de futebol a chutar bem em gol, mas de que isso adiantaria se ele fosse incapaz de decidir contra qual meta mostrar sua eficiência? Ou num exemplo mais teatralmente (ou nem tanto) drástico: posso ensinar alguém o “como atirar” com uma arma, mas o que significaria isso se ele não souber discernir “em que” ou “em quem” atirar? Na verdade, se for para usar sua eficiente pontaria para matar alguém de bem, é melhor que ele não saiba como fazê-lo. Descobrir o “como fazer” sem perguntar-se regularmente pelo “que fazer” pode ser desastroso.
Assim, concluiria eu, mais importante que as receitas são os fundamentos norteadores das nossas ações. Devo claramente refletir sobre “o que fazer”, para só depois pensar no “como fazer”. Mas leio, então, a matéria postada pelo Dildo (duas postagens abaixo) relatando que o Brasil precisa de 107.680 professores de Filosofia; possui atualmente 31.118, dos quais apenas 7.162 são formados em Filosofia. São professores em boa parte sedentos de descobrir o “como fazer”, como atuar em uma área que lhes é parcialmente estranha e em salas de aulas com animosidades adversas. Ao contrário do que se pode pensar, são professores sedentos de conhecimento, mas querem conhecer o “como” e não o “que” fazer. O que me faz perguntar, constantemente, a mim e a outros colegas: nós que discutimos a formação dos educadores, não podemos/não devemos ensinar sim um pouco do “como fazer”, fazendo deste “como” meio para despertar a reflexão sobre o “que fazer”? Não é isso que devemos fazer, ou melhor, não é um nosso “que fazer” educativo?

Em tempo: não penso que esta é uma dificuldade recente ou coisa apenas "do nosso tempo". Reclamamos da educação, da política, dos transportes... como problemas que nunca foram tão graves. Recebi hoje esta foto abaixo, mostrando o transporte público na São Paulo dos anos 1950. Problemas sempre existiram e às mulheres e aos homens de cada tempo cumpre superá-los. Nossa tarefa não é maior ou mais drástica que fora outrora. Mas é a nossa.

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