terça-feira, 1 de abril de 2008

Bolinho de chuva no início do universo


Domingo de tarde estava meio frio e comíamos bolinhos de chuva com café. De repente, a discussão (de uma maneira bem socrática, já que o velhinho de Atenas nos ensinou a seguir o lógos onde quer que ele nos levasse...) passou a versar sobre o Universo, sua existência, origem, destino e tal. Eu disse que, se girássemos o tempo ao contrário, iríamos ver o mundo correr para seu princípio, que seria o que os físicos chamam de singularidade, uma situação na qual o tempo e todas as outras dimensões seriam reduzidos a um único ponto, onde as teorias que usamos para explicar o mundo deixariam de valer (já que seriam unificadas em uma única e incognoscível lei).
E isso é bem difícil de se imaginar, já que as condições que permitem nosso pensamento são, todas elas, regidas pelo espaço e pelo tempo. Se pensar em um mundo no qual não haja espaço já é difícil, imaginar um no qual o tempo não exista é pedir demais para nossos combalidos neurônios. Mas esse seria o começo de tudo, um começo sem tempo e sem espaço, já que nenhum dos dois teria, ainda, sido criado. Depois do Big Bang, da explosão desse ponto de singularidade, então teríamos os átomos, e as moléculas, os planetas e neles, todo o resto (e uma grande questão - mais uma - : por que diabos o ser e não o nada?...
Antes, porém, não havia nada, já que não havia cosmos. "Mas, e antes do cosmos, do universo existir, caro comedor de bolinhos de chuva, o que existia?". Se Santo Agostinho gostava de dizer que antes de fazer o mundo Deus se ocupava de preparar o inferno para quem perguntasse essas coisas, agora podemos dizer, depois da Relatividade, de Plank, de Hawking: antes de haver o mundo, nada havia, nem a condição de se pensar em um "antes". O tempo, sendo resultado da criação do cosmos, resultado da saída do estado de singularidade para aquele que acabou dando nesse aqui, onde existem seres humanos e internet e blogs, não existia antes dele, antes do universo. O antes não existia antes que houvesse algum depois, mesmo que muito pequeno...
Nessa hora, pediram para que mergulhasse meu bolinho de chuva no café e comesse, porque ia ficando frio.
O que isso tem a ver com filosofia? Tudo. As questões dos primeiros filósofos se parecem, muito, com as questões de nossa ciência cosmológica mais avançada. Tales, Anaximandro, Demócrito, Heráclito, todos eles e seus outros companheiros lançaram-se na tentativa de responder às questões que ainda nos assombram, como essa da origem do universo. O que acontece, por vezes, é que os que lidam com filosofia não tem familiaridade com a ciência, ou mesmo consideram-na como algum tipo de ferramenta, regida pela utilidade, pela aplicabilidade. Compreender assim a ciência é compreendê-la mal. A falta de uma educação científica é um problema tão (ou mais!) sério que a falta de uma educação filosófica. Saímos da escola como se ainda vivêssemos no tempo tridimensional de Newton, quando estamos no mundo pluridimensional de Einsten...

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